Um dia Tama Sigulda me contou que passando pelo ateliê de Tao Silgulda observou que o marido, havia tempo, estava parado diante da tela em branco. Incomodada com a cena paralisada como use alguém a tivesse pausado o filme, Tama interrompe e questiona “Não vai trabalhar meu bem? Precisamos pagar as contas”, “Estou trabalhando” respondeu o saudoso artista. Essa cena sempre retorna à minha memória quando estou diante da tela em branco, quando estou buscando lá no mar do meu (in)consciente o que preciso trazer à tona, mas também lembrei dessa história quando me deparei pela primeira vez com essa tela da Bruna Purpou, foi paixão à primeira vista, foi arrebatador.
A tela, um auto retrato de Purpou, traz como título “Quando eu quiser falar com Deus”, a posição da artista lembra Abaporu, a “Monalisa brasileira”, mas ao contrário do personagem de Tarsila, com mãos e pés grandes e a cabeça pequena que representam o trabalho braçal sem necessidade do pensar, Bruna traz sua imagem despida, com mãos e pés pequenos e uma cabeça agigantada, que quase não cabe na tela, e está, como Tao, diante de uma tela em branco. Somada ao título, essa obra traz a possibilidade de tantas reflexões: Seria o artista um mensageiro do divino? Seria a arte a oração do artista? O que se passa na cabeça de um artista quando este se depara com a tela em branco? A tela é o espelho do artista? A arte é o desnudar do artista? Quais as vestes precisam ser arrancadas para que a arte possa fluir? A tela em branco traz paz ou agonia ao artista? Enfim, cada dia que olho para essa obra, ela me traz uma nova mensagem, me inspira, me emociona e me toca num lugar diferente, e, boa obra de arte é justamente assim, ela não nos prende numa interpretação única, mas abre para diversas possibilidades de reflexões, expande o espectador.
A Purpou conseguiu tornar visível o que me era tão abstrato.
Para mim, arte é oração, é por ela que eu rezo e através dela eu silencio meus agitados pensamentos para falar com Deus.
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